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Escrevo, logo existo!

Desde que me conheço por gente que tenho o vício de escrever, por isso cresci rodeada de cadernos e canetas, blocos e lápis, onde por necessidade ou descontracção, ia despejando a vida, os sonhos, as fantasias e o espírito. Sempre adorei cadernos novos e nunca terminava aqueles em que começava a escrever. Deixava sempre ali umas folhinhas no fim, assim em jeito de reticências... Aquele espacinho que fica em aberto, num sinal de continuidade e que deixa aquele misto de expectativa e mistério no ar. Os cadernos novos sempre me souberam a camas acabadas de fazer de lavado, onde eu me podia deitar, aconchegar os sonhos e os pensamentos, as dúvidas e as certezas, as orações e as preces. E as canetas sempre foram os meus terços, os meus japamalas, através dos quais cantava os meus mantras e desenhava os meus mudras ao som de taças tibetanas.


Não sou escritora e nunca serei poeta. Dificilmente algum dia publicarei um livro, mas sou apaixonada pelas letras e por esta dança que aprendi com a caneta. É uma dança que me acalma, esvazia-me a mente acelerada, limpa-me a alma e deixa-me pronta para voltar à vida. Não sou nada criativa. Escrevo sobre o que sinto, sobre o que sou e sobre o que gostava de ser. Liberto através da tinta tudo aquilo que me vai no espírito e me enche o coração. Escrever sou só eu a encontrar um ponto de equilíbrio entre a ponta da caneta e a folha de papel, entre a minha alma e o mundo. Sou só eu a despejar o meu coração e a minha vida, tudo muito direitinho, em linhas retas que se espalham por telas em branco. Sou só eu a jogar conversa fora com a minha alma, na esperança que um dia ela se canse de me ler e também entre nesta dança.


Escrever é o meu processo de catarse, é a minha forma de falar comigo sem o ruído das tantas que fui e das tantas que quero ser. É falar comigo sem os ruídos do mundo real, onde posso dar asas às minhas fantasias e sonhar com todos os reinos encantados que gostava de visitar. É subir pés de feijão e lutar contra gigantes, é fazer visitas ao Wonderland e encontrar-me com o Chapeleiro Louco, é passar pelo Neverland e recordar as memórias felizes de quando era criança, é adormecer num sono profundo e derrotar os fantasmas da minha alma. Escrever é dançar entre mundos, entre sonhos, entre vidas. É orar e encontrar o divino que reside em mim. É chorar as lágrimas que teimam em não sair. É agradecer do coração para a caneta. É sorrir por todas as gargalhadas que foram dadas. É partilhar os segredos que só eu sei. É libertar as emoções que são demasiado fortes para serem expostas ao mundo. É cantar as músicas da minha tristeza e gritar ao som das minhas alegrias. Escrever é entrar naquele lugar seguro que existe dentro de mim e os meus cadernos são a materialização desse lugar. São o palco onde toda a minha vida acontece e onde eu me permito ser sem complexos, sem mentiras e sem-meias verdades. As minhas canetas são quem me conhece melhor. Entre mim e os meus cadernos existe uma ligação profunda e as canetas são o elo que nos liga. São elas que me permitem colocar em perspectiva toda a dimensão de quem eu sou. São elas que fazem o trabalho árduo de traduzir a imensidão do meu Ser e o fazem caber em uma dúzia de linhas.


Escrevo porque sim, porque quero, porque gosto, mas acima de tudo porque preciso. Escrevo porque sou grande demais para caber em mim e preciso de ir libertando espaço da minha existência que vou arrumando em prateleiras do escritório. Escrevo porque tenho sonhos, porque sinto tudo à flor da pele, porque acredito em magia e porque os cadernos precisam de companhia. Escrevo porque as letras me fazem bem e porque gosto de cuidar delas como elas cuidam de mim. Escrevo porque gosto de construir pontes entre o Passado e o Presente. Escrevo porque me ajuda a recordar. Escrevo porque me ajuda a prestar atenção. Escrevo porque se não escrevesse acabaria por perder partes de mim que eu preciso para viver. Escrevo porque quando escrevo a vida faz sentido e o mundo transforma-se num lugar melhor. E se tudo isto não bastasse, escrevo porque a vida é curta demais para não escrever.



 
 
 

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